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sábado, 21 de maio de 2011

Entrevista ao Correio Braziliense

Anticorpo feito em laboratório "defende" pulmões de prematuros

Publicação: 20/05/2011 08:44 Atualização:
Uma revisão recente na literatura médica, feita por um grupo de especialistas reunidos na Associação Americana de Pediatria (AAP), reafirma a eficácia de uma droga clonada em laboratório que pode salvar vidas de bebês prematuros e de crianças consideradas de alto risco nascidas de partos normais, com até 2 anos. O primeiro grande estudo com o palivizumabe — um anticorpo monoclonal humanizado, obtido em laboratório com uma técnica de rearranjo do DNA — tem mais de uma década e foi produzido por cientistas do Reino Unido, do Canadá e dos Estados Unidos. Referendadas por vários países, inclusive o Brasil, por meio da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), as análises mostram que o medicamento reduz o índice de internação de lactentes de gestação normal e prematura afetados por doenças respiratórias numa faixa de 55% a 70%.

A releitura dos dados sobre a droga pela AAP coincide com o período de maior risco de contaminação de bebês pelo vírus sincicial respiratório (VSR) no Brasil, que envolve os meses de abril a agosto ou de maio a setembro. “O vírus afeta crianças prematuras, principalmente aquelas com fibrose cística. Não existe tratamento específico para o vírus, então a solução foi fornecer ao organismo, como profilaxia, um anticorpo produzido em laboratório, que é específico para o VSR”, explica o imunologista Roque Almeida, da Sociedade Brasileira de Imunologia. Quando fala em cuidados profiláticos, no sentido de proteger os pulmões dos prematuros e de crianças com até 2 anos, Roque Almeida se refere ao poder do palivizumabe de prevenir o ataque do VSR aos brônquios e pulmões.

O uso do medicamento, no entanto, pelo menos no Brasil, depende da iniciativa de algumas secretarias estaduais de Saúde (leia abaixo), como as de São Paulo e do Rio de Janeiro, entre outras, que baixaram normas técnicas e resoluções abrindo o acesso aos pais que apresentem pedidos bem fundamentados por médicos. Cada caso, porém, é rigidamente acompanhado. Isso explica, em parte, a dificuldade de se localizar o anticorpo, sobretudo por ser essa uma droga cara (custa cerca de R$ 5 mil cada unidade) e muito pouco conhecida, mesmo entre os médicos.

A pediatra Miza Vidigal, que trabalha em unidades de terapia intensiva neonatal de hospitais públicos e privados de Brasília, explica que o bebê deve receber cinco doses de abril a agosto para assegurar a imunização. “Como não se trata de uma vacina, mas de um anticorpo monoclonal, é preciso repetir a dose por cinco meses e os custos são muito altos”, diz. Nesse caso, a substância age como uma espécie de soro. “Uma só etapa do tratamento não sai por menos de R$ 30 mil, porque, no próximo ciclo do VSR, as doses devem ser ministradas outra vez.”

Raro e poderoso
Miza é uma das poucas especialistas de Brasília a prescrever o uso do palivizumabe. A pediatra lamenta que, apesar da recomendação da Sociedade Brasileira de Pediatria de se criar um programa — em nível nacional — para assegurar a administração de todas as doses necessárias durante o período de sazonalidade do VSR, poucas unidades da Federação sigam a orientação. “O ideal era que os bebês atendidos fossem acompanhados por meio de um protocolo específico”, observa. “Distribuir o medicamento sai muito mais barato para o Estado do que manter a criança numa Unidade de Terapia Intensiva (UTI).”

Em Brasília, a assessoria da Secretaria de Saúde confirmou que os hospitais da rede pública ainda não fornecem a droga. Se a situação fosse outra, os pais da menina Lara Barros Barbosa, 6 meses, estariam menos aflitos. Lara é prematura, embora hoje esteja “muito bem”, nas palavras de Miza Vidigal, que a acompanha desde a UTI. A menina nasceu com 26 semanas, pesando 1,125kg; e o seu irmão gêmeo, Davi, com 1,135kg. “Eles foram direto para a incubadora. Davi não resistiu, mas Lara, sim, depois de ficar 76 dias na UTI”, lembra Michelle Simonela Barros Barbosa, a mãe de Lara.

“Bebês prematuros não produzem anticorpos e não podem se defender do vírus sincicial respiratório (VSR). Além do mais, eles não têm os pulmões completamente formados e por isso evitamos sobrecarregá-los”, explica a médica. Pensando em assegurar ainda mais a proteção de Lara contra o VSR, Miza prescreveu o palivizumabe em março deste ano, mas até agora a família aguarda aprovação de um processo na Justiça para obter o medicamento. Na mesma situação está a família de Ana Cristina Pereira Marcos, mãe de Alice, 9 meses. “Ela teve gripe e agora está com pneumonia”, disse a mãe, preocupada, por telefone. A aflição dos pais aumenta a cada dia do mês que passa, exatamente quando o VSR ataca maior número de crianças — devido à estação seca e fria.

A lesão e as doenças que ocorrem nas crianças com displasia broncopulmonar deixam a criança com dificuldade para respirar, respiração acelerada e dependência de oxigênio, além de chiado no peito e tosse. “Todos esses sintomas tendem a melhorar com o passar do tempo e com o crescimento pulmonar normal, desde que a criança receba tratamento adequado. Mas só a partir dos 2 anos a criança cria anticorpos. O que pretendemos, em resumo, com essa preocupação, é evitar que prematuros continuem morrendo nos leitos de UTIs”, afirma Miza.

“No caso do palivizumabe, ele é importante para evitar que o VSR ataque os brônquios e os pulmões dos prematuros”, reafirma Roque Almeida. Os estudos de revisão do palivizumabe tomaram como base recomendações da AAP, publicadas originalmente em 1999 e atualizadas em 2003 e em 2007. Outras investigações sobre a utilização do anticorpo em lactentes prematuros de risco mostram que a droga reduziu a incidência de hospitalização relacionada ao VSR em 55% na Espanha e no Reino Unido. No Brasil, essa taxa chega a 70%.

Dosagem
O palivizumabe deve ser administrado de forma intramuscular, 15 mg/kg/dia, a cada 30 dias, iniciando antes do começo da sazonalidade do vírus sincicial respiratório, que, no Brasil, ocorre de abril a agosto e, em algumas regiões, de maio a setembro. Com relação ao caso de Lara, ela ficou mais tempo exposta ao vírus. A pediatra conta que ela precisou fazer ventilação mecânica, com oxigênio prolongado, teve doenças pulmonares típicas de prematuros, como a displasia broncopulmonar, e por conta disso qualquer quadro viral é grave. “Todos os prematuros estão sujeitos ao VSR, mas o caso de Lara é especial. Ela passou por mais de 30 transfusões, teve duas hemorragias e precisa de todos os cuidados possíveis”, justifica a pediatra.

Pelas contas dos pais da garota, Michelle e Frederico Barbosa, a filha passou 76 dias na UTI e 26 no quarto. Ela está em casa há três meses, mas o susto, em parte, já passou. A mãe lembra que, do casal de gêmeos, a menina era a mais frágil, enquanto o menino, Davi, prometia resistir. “Uma semana depois que nasceram, em 2 de novembro, recebemos uma ligação do hospital, pensamos que a notícia fosse sobre a Lara, mas os médicos disseram que havia acontecido com Davi”, conta Michelle.

Combate cerrado
O anticorpo palivizumabe pode ser usado com a administração de outras vacinas. Pacientes com doença pulmonar grave podem se beneficiar com palivizumabe durante a segunda sazonalidade do vírus, se persistirem com doença pulmonar e/ou cardíaca. Há vários estudos na literatura mostrando sua eficácia na prevenção da infecção pelo vírus. Anticorpos monoclonais, em geral, são caros, porque envolvem alta tecnologia, anos de investimentos em pesquisas, produção controlada de cada lote e pouco uso.